Patrocínio: potencial x realidade
O esporte tomou uma importância tão grande no cotidiano das pessoas, que assuntos antes discutidos pelos especialistas em marketing passaram a ser tema de "papos de mesa de bar", indo do grau de influência de patrocinadores/investidores, como a Nike na seleção ou da MSI no Corinthians, aos ganhos estratosféricos dos esportistas "top" com campanhas publicitárias, ou às ações das entidades esportivas para atrair mais público e receitas.
Na verdade, algumas propriedades esportivas se transformaram em plataformas de comunicação tão atraentes que muitas marcas buscam se associar a elas, seja oficialmente, através do patrocínio, ou "informalmente", através de ações que ficaram conhecidas como "marketing de guerrilha", situação em que a empresa se utiliza promocionalmente de uma propriedade esportiva - evento, clube ou atleta - sem ter pago pelo direito de se associar a ela.
As pesquisas de lembrança de marca mostram que as pessoas não conseguem identificar corretamente os patrocinadores oficiais, mencionando muitas vezes o concorrente direto. Esta confusão na mente do torcedor/telespectador é mais do que justificada, já que os resultados para a marca dependem muito mais da criatividade no uso das ferramentas de comunicação para se associar ao evento, do que a compra do direito e o "título" por si só.
A ação de guerrilha da Brahma na Copa de 94 foi o clássico exemplo disso, tendo associado visibilidade de arena (torcida nº 1 e placas nos amistosos) com imagem dos jogadores na mídia e comemorando os gols com o gesto da nº 1. A reação imediata de retaliação por parte das emissoras de TV patrocinadas pelos concorrentes só aumentou a publicidade para a marca "pirata".
Contribuindo mais ainda para esta confusão, há várias oportunidades de patrocínio associadas a um evento do porte de uma Copa do Mundo, como o próprio acontecimento em si, a seleção brasileira, a emissora de TV responsável pela transmissão, a imagem individual dos jogadores e do técnico, a mídia que cobrirá o torneio, isso só para citar as mais óbvias e diretas.
Deixando de lado questões como o limite ético do marketing de guerrilha e as medidas de proteção legais que são tomadas pelos órgãos detentores dos direitos dos maiores eventos, como a Fifa e o COI, a análise do assunto sob o prisma do marketing nos leva a discutir a maneira como o patrocínio deve ser alavancado.
A maioria das empresas acaba se esquecendo de uma regra básica de todo o patrocínio, que é investir pelo menos o mesmo valor pago pela cota de patrocínio para comunicar ao público-alvo que você é o patrocinador, ou seja, o patrocínio deve ser acompanhado pelos demais componentes do mix de comunicação, como propaganda, promoções, publicidade etc.
Por motivos como falta de verba e/ou de cultura para ações paralelas e excesso de confiança na repressão legal dos organizadores, os patrocinadores oficiais destes eventos acabam deixando o espaço aberto na mente do consumidor para os "guerrilheiros" agirem.
Tudo isso faz parte de um amadurecimento do mercado de patrocínio, que no Brasil ainda é encarado tanto pelo comprador como pelo vendedor, como "compra de mídia". Desta maneira, uma poderosa ferramenta acaba sendo sub-utilizada, já que a visibilidade de mídia poderia ser complementada por ações promocionais que gerem vendas e entretenimento/relacionamento com os públicos-chave do patrocinador. Já nos mercados onde o histórico de patrocínio é maior, a ação pressupõe um envolvimento e um comprometimento maior do patrocinador com a propriedade patrocinada.
Algumas agências de marketing esportivo no Brasil começam a disseminar esta nova cultura, mostrando a seus clientes todas as possibilidades que o patrocínio pode trazer às marcas, desde o planejamento das ações que mais se adequam ao perfil do patrocinador, passando pela coordenação e avaliação dessas ações.
Pressionadas pelos clientes, as próprias agências de publicidade, que sempre se mantiveram distantes desse negócio por falta de maiores incentivos, começam a se estruturar para atender a essa demanda por soluções inovadoras.
Este "distanciamento" fica evidente quando comparamos a relação de investimento em publicidade com patrocínio: apesar do Brasil estar entre os maiores mercados publicitários do mundo, a relação de investimento de patrocínio em relação ao mercado publicitário é de apenas 4%, contra a média de 8% em países como Estados Unidos, Inglaterra, Japão, Alemanha e Canadá.
Há uma série de indícios sobre essa baixa participação do patrocínio nos investimentos, como o estágio de maturidade dessa indústria (relativamente nova em relação às outras mídias) e a falta de conhecimento sobre os resultados (pesquisas de avaliação de resultados, cases etc.)
De um modo geral, os principais entraves ao desenvolvimento do patrocínio por aqui são:
- Falta de hábito de inserir o patrocínio no planejamento da verba de marketing e comunicação, já que o mesmo é considerado um investimento de oportunidade, com poucas informações consistentes sobre retorno e falta de cultura sobre este mercado, o que estimula a opção pela mídia convencional
- O mercado comprador de patrocínio é mal atendido, sendo que os maiores dificultadores no processo de escolha são:
Planos de patrocínio inadequados aos seus objetivos de marketing;
Dificuldade de medir retorno (falta de serviços de pós-venda);
Incerteza na execução e na entrega do plano (aspectos operacionais dos eventos);
Dificuldade para reconhecer oportunidades (ofertas fragmentadas e não disponíveis no momento certo);
Maior risco, dados os problemas estruturais do esporte e a falta de informações suficientes para a tomada de decisão;
Ausência de visibilidade na mídia;
- Mercado vendedor (donos de propriedades) não tem acesso aos compradores e/ou não tem seu foco (equipe e conhecimento) na comercialização de seus produtos, o que o obriga a recorrer a intermediários que não agregam valor ao processo
- Compradores têm visão de curto prazo, utilizando o patrocínio com a única finalidade de obter visibilidade de marca, ao invés de buscar um envolvimento emocional e mais duradouro com os consumidores da marca escolhida
Dadas as dificuldades mencionadas, várias agências de publicidade não recomendam o patrocínio aos seus anunciantes e chegam a encará-lo como concorrente da sua verba, já que:
- não têm gente especializada para recomendar ações de patrocínio integradas às demais ações de marketing sobre as quais a agência já atua
- não são incentivados financeiramente a prestar serviço nessa área, através de comissões e bonificações que justifiquem seu investimento para se especializar, como acontece com as mídias tradicionais
- muitos anunciantes acabam por negociar o patrocínio diretamente, utilizando a agência em um eventual serviço prestado dentro desse processo, o que se reflete em uma remuneração proporcional à importância desse serviço
Somente com a superação gradual dessas "barreiras", o nosso mercado passará e a compreender melhor o papel que o esporte tem a desempenhar na comunicação da marca.
(*) Luis Fernando Pozzi , é consultor de marketing esportivo e autor do livro "A Grande Jogada: Teoria e Prática do Marketing Esportivo".
pozzi@blueorange.com.br
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